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Aval para garimpo em terra indígena e contato com povos isolados: os impactos do projeto do marco temporal

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Câmara aprovou proposta de lei que altera a demarcação de terras indígenas e flexibiliza outros direitos dos povos originários. Projeto agora vai para o Senado - Foto: Reprodução Internet

A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (30) uma proposta que altera a demarcação de terras indígenas e flexibiliza direitos indígenas estabelecidos pela Constituição.

Um dos principais pontos do projeto é a instituição do chamado “marco temporal”, que estabelece que territórios só podem ser demarcados caso seja comprovada a presença indígena na data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.

Essa não é, no entanto, a única alteração prevista no texto, que tramita há 16 anos no Congresso Nacional e já teve mais de 10 outras propostas anexados ao projeto de lei original.

Entre outras mudanças estão:

a autorização para garimpos e plantação de transgênicos dentro de terras indígenas;

a flexibilização da política de não-contato de povos em isolamento voluntário;

e a possibilidade de realização de empreendimentos econômicos sem que os povos afetados sejam consultados.

“Sempre que se fala desse projeto, se coloca só a questão do marco temporal, mas esse PL [Projeto de Lei] é muito nocivo aos povos indígenas. São uma série de direitos que seriam vilipendiados”, afirmou ao g1 Mauricio Terena, advogado e coordenador jurídico da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, principal referência no movimento indígena).

Na semana passada, os deputados aprovaram o regime de urgência para a tramitação da proposta, possibilitando que ela fosse direto à votação em Plenário, sem passar pelas comissões temáticas da casa. Aprovado pela maioria dos deputados, o projeto agora segue para análise do Senado.

LEIA TAMBÉM: Marco temporal das terras indígenas: entenda o que está em jogo no Congresso e no STF

O texto é amplamente apoiado pela Frente Parlamentar da Agropecuária, que representa a bancada ruralista. O presidente da Câmara, Arthur Lira, defendeu nesta terça o projeto: “Estamos falando de 0,2% da população brasileira em cima de 14% da área do país já. Só temos 20% da área agricultável para agricultura e pecuária, e 66% de floresta nativa. Precisamos tratar desse assunto com coragem em algum momento”, afirmou.

Já todas as principais associações do movimento indígena se colocam frontalmente contra a proposta, considerada uma das principais ameaças aos direitos indígenas. As terras indígenas equivalem a quase 14% do território nacional e são os territórios em que a natureza permanece mais protegida. De acordo com um levantamento do MapBiomas, as áreas privadas responderam por 68% de toda a perda de vegetação nativa no Brasil nos últimos 30 anos — já as terras indígenas respondem por menos de 2% dessa perda. Segundo a ONU, os territórios indígenas na América Latina, incluindo no Brasil, armazenam mais carbono — principal gás do efeito estufa, que vem levando ao aquecimento acelerado do Planeta — do que todas as florestas da Indonésia e do Congo (os dois países com mais florestas tropicais depois do Brasil) “Falar sobre as terras indígenas, o marco temporal e esse projeto de lei é falar sobre política climática. As terras indígenas são um importante aditivo no combate às mudanças climáticas”, diz Mauricio Terena.

Entenda nesta reportagem o potencial de impacto do marco temporal e quais são as outras alterações previstas na proposta. Confira:

Quais as consequências do marco temporal

Como a proposta autoriza o garimpo e outras atividades econômicas em terras indígenas, entre elas a plantação de transgênicos

O que muda em relação ao direito de consulta

Como fica a política de não-contato com povos isolados

Quais são as outras mudanças no processo de demarcação de terras indígenas

Quais as consequências do marco temporal

A Constituição Federal determina que cabe à União demarcar as terras “tradicionalmente ocupadas” pelos indígenas. Essas terras são definidas como aquelas que:

  • são habitadas por indígenas em caráter permanente;
  • são utilizadas para suas atividades produtivas;
  • são imprescindíveis à “preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”;

A Constituição não determina uma data-limite para definir o que é um território tradicionalmente ocupado. O projeto em pauta na Câmara pretende fazer justamente isso, ao definir que “a ausência da comunidade indígena na área pretendida em 5 de outubro de 1988 descaracteriza o enquadramento” como “terra tradicionalmente ocupada”. A exceção seriam casos de comprovado conflito pelo território até a data da promulgação da Constituição.

Na prática, caso o marco temporal seja aprovado, indígenas que não conseguirem comprovar que estavam em determinada área antes de 1988 não conseguirão a demarcação, ignorando que muitos povos foram expulsos ou forçados a saírem de seus locais de origem –inclusive por determinação estatal durante a ditadura militar.

Além disso, processos de demarcação ainda não finalizados e que se arrastam há anos poderão ser suspensos. A maioria das terras que ainda não sem o processo de demarcação finalizado está fora da Amazônia Legal. Segundo o Instituto Socioambiental, são pelo menos 145 terras que ainda não tiveram o processo de reconhecimento concluído –elas equivalem a apenas 1,6% da área total de Terras Indígenas (TI) no país e abrigam 45% da população indígena em TIs.

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